Texto I
No episódio narrado, Rita Baiana dança aos olhos de Jerônimo, português recém-chegado ao Brasil.
” Eu vi a Rita Baiana, trocar de vestido por uma saia, surgir de ombros nus, para dançar. A luta destoldara-se nesse momento, envolvendo-a na sua cama de prata, a cuja refulgir os meninos da mestiça melhor se acentuavam, cheios de graça irresistível, simples, primitiva, feita toda de pecado, toda de paraíso com muito de serpente e muito de mulher.
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Naquela mulata estava um grande mistério, a síntese das impressões que ele recebeu chegando aqui: ela era luz ardente do meio dia; ela era o calor vermelho das sextas das fazendas, era o aroma quente dos trevos e das baunilhas, que atordoara nas matas brasileiras; era a palmeira virginal e esquiva que se não torce a nenhuma outra planta; era o veneno e o açúcar gostoso; era o sapoti mais doce que o mel e era a castanha do caju, que abre ferida no azeite do fogo…”
( Aluísio de Azevedo. O cortiço. 9 ed. São Paulo: Ática, 1970.p.56-7)

Texto II
A tarde inteiramente fudida em sons. Sons implorando, chamando. Sons da vida […]
Armando e seus irmãos cantavam e, levantando os pés e sacudindo os braços, dançavam. A terra fremia, os corpos fremiam. As mulheres e as crianças tinham txa-txa nas mãos e faziam o ritmo. Os olhos das crianças abriam-se redondo como sois, as bocas rasgavam-se em gritos de canção. Pés, vozes e tambores guiados de compasso enchiam a tarde de fundo da Munhuana, de Mato e exotismo.
…
Os corpos delas agitavam-se em modelos de movimento. Voluptuosamente!
Da cintura para baixo a vida revoltava-se e freme na carne e transforma-se em ritmo. O mundo está ali agora e os olhos dos homens estão cheios de tesoiros. Elas estão sérias nas caras e nos corpos são vulcões. África dança e vive ao som do chigubo e as ancas são muitas histórias de luar e sombras de cajueiro em flor. África dança e o mundo está suspensos nos olhos dos homens palpitantes nas promessas latentes. Promessas de homens. Promessas de machos.
…
Os negros dançam, mulheres mexem os quadris, os olhos dos homens estão cheios de promessas. Promessas de coisas que ninguém pode falar, e para saber quando é tempo, quando é dia de falar.”

( José Craveirinha. Hamina e outros contos. 2 ed. Lisboa: Caminho, sd.p.33-4)
Literatura Brasileira em diálogo com outras literaturas e outras linguagens. William Cereja e Tereza Cochar. 5 ed.reform. São Paulo: Atual, 2013.
Marii Freire Pereira
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Imagens: Di Cavalcanti/www.arte.seed.pr.gov.br/
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Capa do livro Hamina e outros contos: Literatura Brasileira/ William Cereja e Tereza Cochar.
Santarém, Pa 17 de novembro de 2021
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