É a hora em que o sino toca,
mas aqui não há sino;
há somente buzinas,
sirenes roucas, apitos
aflitos, pungentes, trágicos,
uivando escuro segredo;
desta hora tenho medo.
É a hora em que o pássaro volta,
mas de ha muito tempo não há pássaros;
só multidões compactadas
escorrendo exaustas
como espesso óleo
que impregna o lajedo;
desta hora tenho medo.
É hora do descanso,
mas o descanso vem tarde,
o corpo não pede sono,
depois de tanto rodar;
pede paz- morte – mergulho
no poço mais ermo e quedo;
desta hora tenho medo.
Hora delicadeza,
gasalho, sombra, silêncio.
Haverá disso no mundo?
É antes a hora dos corvos,
bicado em mim, meu passado,
meu futuro, meu degredo;
desta hora, sim, tenho medo.
Carlos Drummond de Andrade. Anoitecer. A Rosa do Povo. Círculo do livro. São Paulo, 1945
Marii Freire Pereira
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Imagem: pinterest. It’s a beautiful world.
Santarém, Pá 18 de Julho de 2021
Maravilhoso! ❤
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Sim. Lindo!👏🏻👏🏻👏🏻
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